“Após o fim da infecção pelo coronavírus, surgem problemas como perda de memória, dificuldade em manter o foco e/ou a atenção e dificuldades com a percepção visual”
Dr. Marcelo Valadares

Pesquisadores do mundo todo esforçam-se em busca de respostas para combater a COVID-19 e entender como ela afeta o cérebro humano. Perda de paladar e olfato é um dos sintomas mais comuns conhecidos por grande parte da população, mas estudos têm demonstrado que a infecção pelo SARS-CoV-2 vai muito além quando observamos as consequências do novo coronavírus no cérebro.

Como tudo é novo e desconhecido em relação à COVID-19, há muita especulação em relação às suas consequências para o organismo de pacientes acometidos pela doença, principalmente depois que se recuperam.

Entretanto, estudos preliminares começam a trazer algumas respostas sobre como o vírus SARS-CoV-2 pode afetar o cérebro:

COVID-19 interfere nas funções cognitivas

Um trabalho inédito, publicado no início de fevereiro pelo InCor (Instituto do Coração) da Faculdade de Medicina da USP (Universidade de São Paulo), revela que, após o fim da infecção, surgem problemas como perda de memória, dificuldade em manter o foco e/ou a atenção como se fazia antes no cotidiano e dificuldades com a percepção visual.

Causa perda de olfato

Na infecção por coronavírus, é muito comum que lesões nos nervos e bulbos olfatórios levem à perda de olfato (anosmia). Em um estudo europeu de 2020, em 87% dos pacientes a anosmia foi um dos sintomas mais comuns da doença.

Embora a incidência de casos permanentes seja muito menor (cerca de 5%), a infecção viral é capaz de levar à perda de olfato permanente. Porém, em alguns casos, existe tratamento para a recuperação.

Aumenta chances de AVC 

A COVID-19 ainda está ligada a um aumento na formação de coágulos em artérias, podendo levar ao Acidente Vascular Cerebral (AVC). Estudos internacionais, principalmente nos Estados Unidos, identificaram que muitos pacientes jovens com Covid-19 também foram diagnosticados com AVC.

Altera a conectividade cerebral

Um estudo realizado pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) sugere que a COVID-19 pode alterar o padrão de conectividade funcional do cérebro, mesmo nos casos leves. As conclusões são baseadas em exames de ressonância magnética funcional (com sequência de repouso) feitos em 86 voluntários que já haviam se curado da infecção há pelo menos dois meses.

No cérebro normal, determinadas áreas estão sincronizadas durante uma atividade, enquanto outras estão em repouso. Já no caso desses indivíduos que tiveram a COVID-19, segundo a pesquisadora Clarissa Yasuda, professora da Faculdade de Ciências Médicas (FCM-Unicamp), foi notada uma perda severa da especificidade das redes cerebrais, ou seja, “tudo fica conectado ao mesmo tempo” e isso, segundo a professora, provavelmente leva o cérebro a gastar mais energia e trabalhar de forma menos eficiente.

COVID-19 pode alterar estruturas do cérebro

O córtex é a região do cérebro responsável por funções complexas como memória, atenção, consciência e linguagem. No estudo conduzido pela Unicamp, exames de imagem revelaram que algumas regiões do córtex dos voluntários tinham espessura menor do que a média observada nos controles – entre elas áreas relacionadas com a ansiedade.

Após seis meses, 642 participantes do estudo relataram sofrer com os sintomas tardios da doença, como fadiga/cansaço (59,5%), sonolência diurna (36,3%), alterações de memória (54,2%), dificuldade de concentração (47%) e para realizar as atividades diárias (23,5%). Além disso, 41,9% relataram sintomas de ansiedade.

Outras regiões do cérebro, segundo o estudo, apresentavam aumento de tamanho, o que pode estar relacionado com o inchaço decorrente da infecção.

Novo coronavírus infecta células do tecido cerebral

Outro estudo comprovou que o vírus SARS-CoV-2 é capaz de infectar células do tecido cerebral tendo como principal alvo os astrócitos, células mais abundantes do sistema nervoso central que desempenham funções variadas, como oferecer sustentação e nutrientes para os neurônios e regular a concentração de neurotransmissões e de outras substâncias com potencial de interferir no funcionamento neuronal, como o potássio.

Portanto, além da perda do olfato, os pacientes podem sentir principalmente dores de cabeça crônica, sensação de fadiga no corpo, tontura, fraqueza generalizada e até mesmo ansiedade e depressão. A infecção por SARS-CoV-2 já demonstrou que estes são sintomas de longo prazo, mesmo após a resolução do quadro respiratório. Por enquanto, estudos apontam que são condições passageiras, mas que merecem atenção do paciente e acompanhamento médico.

Sem dúvida, a COVID-19 vem desafiando a ciência e esses estudos mostram que devemos dar uma atenção ao impacto da doença nas funções cerebrais.

Referências: